sábado, 29 de outubro de 2011

Atos de guerra




                Nikolaiev estava sentado na varanda de sua casa, fumando seu antigo cachimbo de marfim, soltando alguns círculos de fumaça e lembrando-se de algo em seu passado. Era vinte e três de Abril, de um país do novo mundo, longe de onde havia presenciado, e cometido, os atos que o fariam nunca mais ter uma única noite de sono tranquilo novamente.
Lembrava-se do dia em que prestou seu ultimo serviço pela pátria que amava e que depois passou a odiar com cada fibra do seu corpo.
Faltando alguns dias para o encerramento de seus serviços, Dimitry Nikolaiev, capitão do III Regimento de Infantaria do Exército Tcheco, recebeu ordens para atacar e destruir um prédio na região norte da Bulgária, onde sabidamente a Inteligência havia informado sobre atividades inimigas e que o prédio estava sendo usado como QG das forças inimigas.
Havia realizado durante toda sua carreira, centenas de missões como esta, e certamente era o melhor homem para fazer isso de modo silencioso, eficaz e rápido, tudo como um perfeito soldado faria. Eficiente e sem questionar nada.
Quando chegou ao local, um vilarejo pobre e afastado das linhas de guerra e notou que efetivamente havia uma grande movimentação de soldados inimigos pelo local e imediatamente localizou o prédio que deveria atacar. Um prédio baixo, de no máximo dois andares, com paredes grossas e janelas pequenas, um prédio perfeito para servir de quartel general para as forças inimigas. Sua única dúvida era do porque este QG ficava tão afastado e como as comunicações haviam sido interrompidas não havia meios rápidos para transmitirem mensagens a partir dali.
No entanto, seu trabalho não era pensar, mas sim executar os planos para ele entregues.
Durante a noite, havia apenas dois guardas na entrada do prédio que faziam rondas de apenas um por vez a cada quarenta e cinco minutos. Era um tempo bom para acessar as grades do porão, entrar, plantar os explosivos nas colunas de sustentação e outras no teto do porão, que seria o piso do prédio, que fariam com que boa parte voasse pelos ares.
Nas duas ordens diziam que não importando a hora em que plantassem os explosivos eles deveriam ser detonados por volta das onze da manhã ou cinco da tarde, horários esses em que o prédio estava com a maior quantidade de soldados e provavelmente os generais estariam também.
Faltando apenas quinze minutos para as onze da manhã, Nikolaiev e seus homens estavam apostos aguardando a movimentação aumentar para que pudesse cumprir suas ordens com rapidez e assim poder desfrutar de uma vida de sossego e descanso.
Faltavam três minutos e viu que a movimentação de soldados, fardados ou não e mulheres que provavelmente seriam soldados também, começaram a entrar. Quando deu exatamente onze horas, o sino da igreja local tocou e com um espelho ele enviou o sinal para o homem que iria detonar os explosivos, acendendo o pavio.
Assim que enviou o sinal e o pavio foi aceso, a porta se abriu e saiu um soldado segurando uma criança no colo e uma mochila infantil em suas costas.
A cena passou em seus olhos como se cada segundo fossem anos e então ele percebeu o que era aquele local e porque fora construído daquela maneira. Mas não havia tempo para recuar o ataque. O pavio já adentrava o subsolo da construção e então aconteceu.
A explosão foi tão violenta que arrancou árvores pequenas que cercavam o prédio a uns dez metros de suas paredes. Com lágrimas nos olhos ele percebeu corpos sendo arremessados pelo ar e uma boa parte do prédio soterrando uma enorme quantidade de crianças e seus pais que haviam ido buscá-las na escola.
O homem que havia saído primeiro e estava um pouco afastado quando o ato terrorista aconteceu, fora arremessado a muitos metros de distancia e jazia no chão, todo ensanguentado segurando o corpo de seu filho sem vida nos braços. Dimitry aproximou-se do homem, com seus olhos inundados de água e soluçando muito, já havia arrancado suas insígnias de capitão e de seu país do peito, envergonhado pelo que havia feito, mas sabendo que vergonha nenhuma no mundo apagaria o que acabara de fazer.
Segurando sua pistola, aproximou-se do homem que estava ajoelhado segurando seu filho no colo, que o olhou horrorizado e virou de costas, mas não saiu do lugar, apenas protegendo o corpo falecido de seu filho. Com sua mão esquerda pegou a pistola pelo cano e virou o cabo na direção do homem que estava no chão, chorando, abriu a camisa e disse:
- Nada pode reparar meu erro, eu estava apenas cumprindo ordens de homens incapazes que estão no poder e mesmo assim, são os verdadeiros responsáveis pelo que aconteceu aqui. Mate-me, não posso suportar viver com o que fiz!
O homem, chocado com o que acabara de presenciar e com as atitudes do capitão, pegou a arma da mão de Dimitry e durante alguns segundos, que para Nikolaev pareceu uma vida toda, segurou a arma apontada para ele. Dimitry fechou os olhos e aguardou o tiro que tiraria aquela dor do seu ser. E o tiro veio.
Ainda de olhos fechados pensou:
- Nossa! Não dói morrer, mas porque ainda continuo sentindo essa dor em minha alma?
Aos poucos, sua percepção foi retornando e ele experimentou abrir os olhos lentamente, com medo do que veria do outro lado. Se as pessoas que matou durante a guerra os estariam esperando para julgá-lo, acusá-lo ou perdoá-lo, sabendo que ele somente cumpriu ordens.
No entanto, seu choque foi tão ou mais assustador quanto o inicial, pois o soldado com a arma havia tirado a própria vida com um tiro abaixo do queixo, punindo-o assim da forma mais violenta possível. Ter de conviver com a dor dos seus atos.

Iludir



                Não adianta. Sempre que esperamos algo das pessoas, quando esperamos muito mesmo por algo, elas nos decepcionam. Às vezes penso se isso não é inerente ao ser humano, ou se eles fazem simplesmente pelo prazer de te magoar, ou até mesmo se eles se decepcionam com algo em nós e acabam nos magoando depois. Queria saber por que é que ficaram nos alimentando com falsas esperanças antes.
As historias que ouço, as reclamações que aconselho, em geral provem da mesma origem, pessoas medíocres que não se preocupam com as promessas que fazem, nem se preocupam com segurar a língua dentro da própria boca. Alerto sobre uma coisa, cuidado. Você está tão suscetível a sair machucado como quando machuca com palavras levianas e atos impensados.
Não importa o que você está sentindo no momento, para alguns instantes, respire, mentalize e se possível mantenha a sua maldita matraca fechada e vá fazer outra coisa, trabalhe, corra, pratique algum esporte que libere muitas “inas”, canse-se, durma e quando acordar, pense no que quis falar no dia anterior, SE por um único segundo estiver disposto a repensar em algo do que quis falar antes, a não ser que seja para melhorar a proposta já pretendida, então nem a faça.
Além de estar iludindo alguém que provavelmente não merece ser sacaneado (sim, há quem mereça), você esta enganando a si mesmo e definitivamente essa é a pior das ilusões. Ficar preso nas próprias teias que criou é, senão a pior, uma das piores idiotices que pode cometer contra si mesmo.
Já passei por isso, de me enganar e de enganar a quem não mereceu e sinto as feridas causadas por isso até hoje. Estou longe de ser o melhor homem do mundo, mas também não estou nem perto do mais cretino ou do cretino medíocre que já fui um dia.
Portanto, antes de alimentar a alma de alguém com esperanças e ilusões que em dois ou três dias você se arrependerá ou que sejam apenas para satisfazer seu pênis, melhor que não faça. O gosto de bílis que fica na alma é inevitável, caso tenha ou venha desenvolver um mínimo de escrúpulos posteriormente. Sei disso e isso marca minha alma até hoje. Dói.